"Abraçados por
Francisco"
Professor Evandro Gussi
Da Redação
Papa Francisco deixou muito claro
que não tem medo de navegar contra a correnteza
Papa Francisco, à primeira vista,
é apenas um daqueles casos raros em que, mesmo conhecendo-se alguém a tão pouco
tempo, temos a impressão de uma amizade antiga. Esse pensamento, que certamente
penetrou os corações de milhões de brasileiros, tem sentido, pois conhecemos
Francisco há dois mil anos, desde que Nosso Senhor, perguntando a São Pedro se
ele O amava, ouviu aquele sincero “Sim, Senhor, tu sabes tudo. Tu sabes que te
amo!”.
Foi ali que Pedro, e também
Francisco, ganharam nossos corações, pois receberam de Jesus o mandato de
apascentarem cada um de nós, Suas ovelhas. Conhecemos Francisco, pois a ovelha
conhece a voz do Pastor. Foi assim que milhões delas acorreram ao Rio de
Janeiro e tantas outras acompanharam pelos meios de comunicação.
Esse foi justamente o cartão de
visitas do Papa, que pediu aos brasileiros licença para entrar em seus
corações. Francisco deixou bem claro que vinha em nome de Jesus – o Cristo
integral – o mesmo de Pedro, que ele trazia, agora, a cada um de nós! Sua
mensagem foi sólida como deve ser a rocha sobre a qual se constrói a Igreja,
contrariando as expectativas daqueles que, como já nos advertia Leão XIII, têm
uma “sede de inovações, que há muito tempo se apoderou das sociedades e as tem
numa agitação febril” (Rerum Novarum, n. 1).
Reunido com os jovens argentinos,
o Papa foi mais longe: disse que podemos espremer uma laranja ou uma maçã, mas
não a Fé: “A fé é integral, não se espreme. É a fé em Jesus. É a fé no Filho de
Deus feito homem, que me amou e morreu por mim”. Assim, o Papa Francisco
conseguiu a síntese perseguida pelo Concílio Vaticano II: comunicar a Fé de
sempre com a linguagem própria dos tempos atuais.
Para fazer isso, Papa Francisco
deixou muito claro que não tem medo de navegar contra a correnteza, ou seja, que
não devemos abandonar a fé para parecermos agradáveis às pessoas ou ao modo de
ser do nosso tempo. Na missa celebrada com os bispos, padres e seminaristas,
pediu que “tivessem o valor de ir contracorrente dessa cultura”. Francisco não
demonstrou apenas ter coragem de falar e agir contra esse modo corrente de
pensar; pediu que cada um de nós fizesse o mesmo, levando, de modo especial, os
valores incondicionais da vida e da família.
Com isso, o Papa recorda que, na
verdade, a Fé sempre contribuiu para a elevação cultural dos povos, pois ela
parte de uma concepção plena da pessoa humana, revelada em Nosso Senhor, fato
que o Santo Padre lembrou como próprio também da cultura brasileira, “que
recebeu também a seiva do Evangelho, a fé em Jesus Cristo, o amor a Deus e a
fraternidade com o próximo” . Segundo Francisco, é justamente o resgate desse
traço tão importante da nossa cultura que pode ser “um processo construtor de
um futuro melhor para todos”.
O Papa nos trouxe também os
aspectos característicos da autêntica caridade evangélica em palavras e atos.
Sua opção pelos pobres não é de ordem materialista ou revolucionária: longe
disso, ela é pessoal. Diante da pobreza e da marginalização, o Papa não nos
pediu discursos ou análises conjunturais, mas as Obras da Misericórdia (o Papa
recomendou que se lesse o Capítulo 25 de São Mateus), pois, do contrário,
alertou o Papa, a Igreja se transformaria em uma ONG. Nada contra as ONG’s,
mas, definitivamente, o Papa deixa claro que o papel central da Igreja é
apresentar a redenção da humanidade, conquistada pelo Sangue precioso de Nosso
Senhor.
Ocorre que aquele que tem um
encontro com a Pessoa de Nosso Senhor não suporta mais a indiferença em relação
aos que sofrem. No entanto, agem assim, pois veem nos sofredores, “a Carne de
Cristo”, como lembrou o Santo Padre na Visita ao Hospital São Francisco de
Assis. Agem assim, pois estão alicerçados na Esperança Cristã – de longe a
palavra mais utilizada pelo Santo Padre, 38 vezes, no total – segundo a qual
temos uma certeza expectante de uma vida eterna no céu, o que nos permite
gastar esta vida terrena servindo a Deus na pessoa do próximo, daqueles que
mais precisam.
Foi seguindo esse caminho que,
nos últimos dois mil anos, tantos e tantos católicos gastaram a vida construindo
a maior obra de caridade que a história já viu ou verá. Fizeram assim, pois
estão alicerçados em uma Fé, que lhes dá Esperança e lhes impulsiona para o
Amor. Francisco também não se esqueceu de uma das mais altas formas de
caridade, quando advertiu que somos responsáveis por formar uma geração de
pessoas capazes de “reabilitar a política” e de “trazer uma visão mais
humanista à economia”. Como prometera em seu primeiro discurso, o Papa
Francisco realmente nos abraçou e abraçou também, com seus gestos e palavras,
todas as mais profundas esferas da existência humana.
Evandro Gussi - formou-se em
Direito pela Toledo de Presidente Prudente, é Mestre em Direito do Estado e
Teoria do Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Doutor em
Direito do Estado pela USP. É professor nas áreas de Direito, Filosofia,
Política e Doutrina Social da Igreja.
Nenhum comentário:
Postar um comentário