Há
muitos anos, por ocasião do Natal, sempre me invadia uma nostalgia e,
acreditem, um mal-estar que me tornava triste, mal-humorado e contrariado. Por
várias vezes repeti para as pessoas que não gostava do Natal e, tal sentimento
me deixava, percebo hoje, envergonhado. A história a seguir, redunda dessa
situação que se repetia, ano a ano e do incômodo que de mim começou a tomar
conta em Novembro de 2012 quando emergiu, no lago escuro da minha ignorância,
uma luz capaz de clarear, de forma milagrosa e aconchegante, como somente o
carinho generoso de Deus pode propiciar, o espetáculo que nos é dado a
contemplar e celebrar a cada ano: o nascimento do menino Jesus.
Como
isto ocorreu?
De
forma simples, embora exuberantemente agradável e sólida. Estava eu verificando
na internet as opiniões a respeito do Natal, quando constatei um número
surpreendente de pessoas desencantadas ou revoltadas com tal festa, por razões
diversas. Isto me alertou que, como cristão, tinha a obrigação de uma palavra boa
a quem se mostrava, na maioria das vezes, revoltado contra Deus.
E saiu
tal reflexão:
Você já
se preparou para a festa de aniversário mais importante do Universo Cristão? Já
falou com seus filhos e amigos sobre o que aconteceu numa simples manjedoura, há
mais de dois mil anos?
Dedique um pouco de sua atenção à história que se segue!
No grotão onde nasci e onde vivi, até os 12 anos de idade, de sugestivo nome ÁGUA LIMPA, a vida sempre foi muito boa. Meu Pai lavrava a terra, nós o ajudávamos a capinar, a preparar a terra, plantar, limpar a plantação, colher milho, feijão, fava, abóbora, cuidar das galinhas e ajudar minha mãe na horta à beira do rio que deu o nome ao lugar. De madrugada, eu e minha irmã íamos à cidade, a pé, a uma légua de distância, para estudar e voltávamos ao final das aulas quando almoçávamos e íamos para a roça trabalhar. Sobrava tempo para tomar banho no rio todos os dias, pescar piabas e bagres, bodocar (caçar passarinhos com bodoque) armar laços e arapucas para pegar codornas, lambús, saracuras, enfim, viver uma vida alegre e feliz.
Meu Pai era um homem digno e
trabalhador, temente a Deus e respeitador da natureza. A propósito, recordo-me,
muito bem, que ele saía a caçar veado ou tatu para nosso sustento. Caçar, não,
ia “buscar” e trazia uma caça que era consumida até o final e, só então, ele ia
buscar outra. Na roça, só andava com uma espingarda ao ombro e um facão na
cintura: nunca o vi tirar a arma para dar um tiro sequer num veado, tatu,
perdiz ou outro animal qualquer que, costumeiramente, cruzava nossos caminhos.
Só o fazia quando a carne acabava na despensa. Aprendi com ele, além do muito
que me deu de exemplo de dignidade e hombridade, o respeito e o carinho pela
natureza, obra de Deus. Tocava viola, muito bem, era folião e tinha muita
admiração por Zé Coco do Riachão, um fabricante de rabecas, violas e um
compositor, violeiro e folião da gema.
Minha
mãe, uma companheira fiel, e uma guerreira carinhosa a cuidar dele e de nós,
com o coração nas mãos. À noite, era costume ficarmos cochilando ao pé do forno
onde ela torrava a farinha e, ao final, assava na pedra umas broas que parecia
ser a coisa mais gostosa do mundo. Durante o dia, cuidava da casa, da comida e,
quando tínhamos “camaradas” na capina da roça, eu a acompanhava a levar a
gamela cheia de comida gostosa, na qual todos os trabalhadores comiam
juntos, numa velocidade estonteante. Era contagiante ouvir o grupo cantando um
canto que até hoje não sei direito o que dizia, enquanto as enxadas afiadas cortavam
o mato para possibilitar à plantação desenvolver-se e produzir frutos.
Era uma vida abençoada, mesmo!
Deram-me o nome do Profeta João Batista e, hoje, atuando na Pastoral do
Batismo, veio-me a curiosidade do porquê da escolha do nome. Infelizmente, meu
Pai já está na folia do céu, não está mais aqui e minha Mãe padece do mal de
Alzheimer e não tem, praticamente, condições de me dizer. Preciso tentar
aproveitar algum pequeno lampejo de lucidez dela para tentar descobrir qual o
motivo de tamanha graça, embora já tenha consciência da missão.
Mas voltemos ao grotão onde nasci. Estamos no início do mês de Dezembro. Tudo se transformava. Minha mãe pintava de preto alguns papéis de embrulho ou jornais, usando goma de mandioca e pó de café, moldando pedras, com as quais montava uma lapinha, cada ano mais bonita. Meu Pai ia comigo a uma gruta numa fazenda vizinha, buscar alguns estalactites ou estalagmites os quais, colocados no interior da gruta, à luz das velas, cintilavam como estrelas no céu a piscar, de forma similar àquela que guiou os Reis Magos até a manjedoura. Sobre uma camada de areia alva como leite, minha mãe colocava as imagens de Nossa Senhora e São José, o menino Jesus no berço, os três reis magos, alguns pastores com um cordeirinho ao pescoço, anjos dependurados e uma estrela na parte superior da entrada da gruta. Ah, quase me esqueci da vaquinha e do carneirinho que eram postados ao lado do berço do menino Jesus!
Não faltava nada na corte do MENINO-DEUS DA PAZ!
Quanto carinho do coração era despejado ali na confecção da lapinha e na
adoração ao Menino-Deus! Com certeza, tal carinho e devoção tocaram o
coração de Deus! Todas as noites, até o dia 06 de Janeiro, dia de Reis,
ali ajoelhávamos, rezávamos o terço e ao final cantávamos: “Eia, meninos a
porfia, cantar um hino de louvor, hino de paz e de alegria, que os anjos cantam
ao Senhor Glóóóóóóóóóóóóóóóória in excelsis Deo!".
Numa das madrugadas, chegavam os
foliões, em respeitoso silêncio, para saudarem o Deus-menino. Que linda homenagem
de homens tão simples, mas, tão sensíveis e puros de coração! Enquanto
cantavam, nós as crianças, aproveitávamos para atacar os biscoitos que minha
mãe escondia num lugar alto, “para servir as visitas e os foliões!”.
Em
outro dia, vinham as pastorinhas fazer uma alegre saudação ao menino-Deus, com
suas danças e cantorias. E nós, de novo, no ataque ao saco de biscoitos! Depois
do dia 06 de janeiro, dia de Reis, era desmontado o presépio.
E
seguia a vida, abençoada por Deus, até ao próximo Natal.
Alí reinava
a verdadeira PAZ, e da lapinha de Belém, com tanta simplicidade montada e
venerada jorraram rios de graças na vida daquela gente simples e crente.
Porque, apesar de o mundo, às vezes, não se dar conta ou não ligar, O
MENINO-DEUS DA PAZ nasce e nos faz renascer em cada Natal.
Com ou sem Papai Noel!
A propósito: não se falou em presentes! Mas, para quê, se ELE se fez PRESENTE?
É muita graça de Deus ter vivido tudo isto!
Glória a Deus nas alturas e Paz na terra aos homens de boa vontade!
João
Batista Gomes Maia
DA Comunidade
Eclesial Nossa Senhora do Perpétuo Socorro e Todos Os Santos de Montes Claros-MG
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