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"(...) A história se repete: a primeira vez como tragédia. A segunda e outras vezes como farsa da tragédia anunciada. (...)" Karl Heinrich Marx (05/05/1818-14/03/1883)

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domingo, 13 de janeiro de 2019

Ameaça de desmaio: antes do preconceito a informação

POR Mara Narciso, médica-endocrinologista e jornalista

“Quem não sabe o que procura, não entende o que encontra”

Após um dia de trabalho anormal, de casos difíceis e exuberante stress, a médica pega seu carro na garagem do prédio do consultório e vai para casa. Tem cerca de meia hora para se preparar para um compromisso logo mais. Sai para a rua, anda dois quarteirões, e quando vira noutra rua, dá de cara com uma cena estranha: uma jovem está no passeio do lado direito, vindo na direção contrária ao carro. É magra, pele clara e, sem saltos, caminha cambaleante, na ponta dos pés, feito um equilibrista sobre cordas. Está com o pescoço esticado, como se quisesse ver ao longe, mas seu olhar está vidrado, parece não enxergar. Ela corre perigo, pois adiante há uma rua movimentada.

A médica encosta o carro junto ao meio fio e para. Desce, aborda a moça que está pálida, esquisita, alheia, como se estivesse sob efeito de entorpecente. Parecendo não ouvir, continua andando. Segura o braço dela e sente o suor frio, vê que não sabe de nada, nem mesmo dizer seu nome. Para ajudá-la, a mulher convida a moça para entrar no carro e a coloca dentro dele. Acomodadas, partem. Para onde? O que fazer? Vê então que a conhece de vista da ADNORTE - Associação de Diabéticos do Norte de Minas. Pergunta onde mora. Responde embolado: Morrinhos. É uma emergência. Precisa comer algo rápido, urgente. É um caso de hipoglicemia. A voz da moça é pastosa, e conversa como uma bêbada. Recostada ao banco, joga a cabeça para trás, passiva, inábil para tudo. Pode ser levada por qualquer um para qualquer lugar, que não se lembrará. Deve ter tomado sua insulina normal, caminhado, atrasado a refeição e a glicose abaixou muito.

A boa samaritana segue em direção ao bairro indicado. A moça não consegue dar seu endereço. No caminho a médica vê uma conhecida na porta de uma casa. Pede ajuda. A outra traz um copo de leite com açúcar. Com muito custo a moça consegue engolir um pouco do líquido. Ambas vão insistindo. O leite escorre, pinga na roupa. A moça não consegue engolir direito e nem entender que sua vida estava por um fio. Esperam, e pouco a pouco a vida ressurge no rosto dela. Com 15 minutos volta a si e conta que passou da hora de comer. Sua cor vai retornando, enquanto começa a se lembrar das coisas, passa a conversar de forma conexa e diz seu endereço. Mora com um irmão. Não se dão bem.

Passado o perigo maior, agradecem a ajuda e partem. Vão rodando por entre ruas estreitas, tortuosas e para a médica, desconhecidas e perigosas. Receia se perder na volta. Vira pra cá, vira pra lá, e após muitos minutos encontram a rua e finalmente a casa. Mesmo melhor, a moça não consegue descer e tomar as providências necessárias. Está fraca, sonolenta, como numa espécie de ressaca. Precisa de apoio para descer. Então, a médica desce, abre a porta do carona, mas pede a ela que espere. Vai até a porta indicada, e chama na campainha. É uma casa humilde, de fundos, lá adiante depois de um comprido e estreito corredor. Após alguma espera aparece um rapaz que, de longe levanta o queixo num gesto claro de “o que que é”? Explicado o problema, com má vontade ele vem abrir o portão. No momento de descer, a moça, levemente tonta, já recuperou toda sua capacidade mental. Amparada pela médica, é levada até o sofá da casa.

Na vinda, tinha contado que tem diabetes tipo 1 desde criança e que já teve hipoglicemia. Mais uma vez foi alertada sobre os riscos da crise, devendo prestar atenção aos primeiros sinais de queda da glicose, ter sempre consigo algum alimento, não atrasar nenhuma refeição, comer de três em três horas, antes do exercício, e antes de deitar. Diante de qualquer alteração, como visão turva, boca dormente, tonteira, fraqueza, suor, tremor, ameaça de desmaio, coração acelerado, medir a glicose e comer. Medir também de madrugada, preventivamente, para saber o que está acontecendo. Naquele tempo, há 18 anos, a moça não tinha glicosímetro, artefato caro, que estava longe de ser disponibilizado para a população.

Alerta geral! Uma pessoa pálida, mente desligada, suando frio, andando como um autômato pode não estar drogada. Sendo hipoglicemia, é preciso lhe dar algum alimento e aguardar sua melhora. Caso esteja desmaiada, pode ser colocado um pouco de açúcar em sua boca, enquanto se espera por socorro. Antes do preconceito, a informação.

Domingo, 13 de janeiro de 2019

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