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Frase

"(...) A história se repete: a primeira vez como tragédia. A segunda e outras vezes como farsa da tragédia anunciada. (...)" Karl Heinrich Marx (05/05/1818-14/03/1883)

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terça-feira, 31 de julho de 2018

Arquidiocese anima movimentos sociais

Quem tem mais de 39 anos de centro urbano sabe a sensação de sair da cidade e encontrar-se com outro mundo. Para quem vive em cidades de porte médio a grande visitar o interior é viajar para fora e conhecer estrangeiros, não estrangeiros habituais, como o norte-americano, o francês, o alemão, mas a realidade social de gente que deveria ser como a gente, porém é tratada com indiferença pela grande mídia e pela sociedade em geral. São os geraizeiros, veredeiros, pescadores artesanais, baianeiros, quilombolas, indígenas, enfim, as populações tradicionais do Norte de Minas Gerais e Bahia, valorizadas pela Pastoral da Terra e centro de atenção no Encontro “Minas e Bahia Cuidando da Casa Comum”, acontecido de 27 a 29 de julho de 2018, no Centro de Pastoral da Paróquia Santo Antônio de Grão Mogol e organizado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT), pelo Projeto de Desenvolvimento Rural e Urbano (Proderur) e pela Arquidiocese de Montes Claros. O tema do evento abordou o meio ambiente: “Água e Cerrado, cultivai e guardai a criação” (Gn 2, 15).

“Esta casa comum está gemendo em dores de parto e precisamos entrar em sintonia com esta casa”, alertou a assistente social, Sônia Gomes de Oliveira, ao abrir a mística do encontro. “Tudo está interligado como se fôssemos um”, afirmou ao apontar para a capilaridade do trabalho de rede da sociedade contemporânea e sua unidade. Mais de 50 militantes de movimentos sociais participaram do Encontro “Minas e Bahia Cuidando da Casa Comum”, como o Movimento dos Pescadores e Pescadoras Artesanais (MPP), o “Correntina pela Vida”, o Coletivo de Mulheres do Norte de Minas, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), o Coletivo São Francisco e a CPT do sudoeste baiano. “Sejam todos bem-vindos à Chácara Santo Antônio de Grão Mogol. Eu que sou daqui, acolho vocês, povos de luta. Sintam-se acolhidos”, saudou a Irmã Etelvina Moreira de Arruda, das Irmãs Franciscanas Missionárias Diocesanas da Encarnação.  

“Viemos fazer barulho em terra alheia”, cantava a liderança da Pastoral da Terra, Luzia Alane Rodrigues, ao animar as comunidades presentes no evento, a exemplo do Vale das Cancelas, Curral de Varas, Bocaina, Batalha, Morro Grande, Taquaral, Ferreirópolis e as cidades mineiras e geraizeiras de Josenópolis, Riacho dos Machados, São João das Missões, Manga, Itacarambi, Januária, Varzelândia, Novorizonte, Salinas, Fruta de Leite e Montes Claros, além de municípios baianos como Correntina.

“Nada melhor do que as pessoas que vivem o dia a dia de luta para falar da sua realidade”, declarou a liderança Ana Paula Alencar, ao dar abertura para o momento de reflexão da conjuntura política, econômica e social das comunidades. As populações tradicionais reclamaram do avanço da exploração da terra na região de Grão Mogol. A paisagem dos cerca de 150 quilômetros de distância do município de 17 mil habitantes à MOC é caracterizada por plantações de monocultura de eucalipto, identificando um grande deserto verde regional. Reclamaram ainda da liberação das riquezas nacionais para o capital internacional. “Na década de 1970, nosso território foi entregue às grandes empresas”, fizeram memória, além de mencionar a contaminação dos rios por veneno e esgoto das cidades. “Grandes transtornos esse modelo de desenvolvimento trouxe”, concluíram ao salientar que “a história se repete, os personagens que são outros”, acrescentaram.

As populações tradicionais denunciaram os conflitos contra as empresas de eucalipto que matam as nascentes dos rios, a falta de água em muitas comunidades, o aumento do desemprego e da violência, o enfraquecimento da saúde pública, a Reforma da Previdência que prejudicou aposentados, a crescente dívida pública. “Grande parte dos nossos problemas está ligado às medidas aprovadas no Congresso Nacional. Vivemos um tempo de desesperança, de descrédito nos movimentos sociais”, emendou a assistente social, Sônia de Oliveira. A importância das comunidades tradicionais para o governo brasileiro é estratégica: ora são valorizadas, ora são desrespeitadas. “O que está acontecendo é reflexo da conjuntura nacional de repressão social, uma onda muito forte contra os trabalhadores e suas comunidades”, completou a assistente social ao ouvir o clamor comunitário contra a privatização das empresas de saneamento básico, a criação do mercado das águas e a proibição de produtos orgânicos em feiras livres.
   
A geração de problemas sociais não para. Disputa comercial em relação à água: água como bem comum e água como mercadoria. “A água é um instrumento que liga todas as lutas. Não existe defesa da água se não existir defesa do território”, garantiu a assistente social embasada na história de que nas décadas de 1970 e 1980 começaram as grilagens de terras e a criminalização dos movimentos sociais. Passaram a enfraquecer o trabalho de base da Igreja católica e a enaltecer o modelo de Igreja de televisão nas comunidades. A relação entre fé e vida foi enfraquecida para, em contrapartida, esconder o mapa da corrupção. O Norte de Minas Gerais é o lugar onde mais se vende votos.

Há ameaças a lideranças camponesas pelos fazendeiros. A Secretaria de Patrimônio da União (SPU) dificulta documentação que oficializa as comunidades tradicionais dos quilombolas, dos geraizeiros e dos vazanteiros em prol dos grandes proprietários rurais. Empresários também são beneficiados. Eles incluem áreas de moradores como Área de Preservação Ambiental (APP) das empresas. Há discriminação da polícia aos movimentos sociais. Assim, é necessária a luta pela autodeterminação do território pelas comunidades com a unificação popular.


Texto e imagens: João Renato Diniz Pinto jornalista voluntário da Comissão Pastoral da Terra (CPT)  Regional Norte de Minas Gerais 











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