ALVORADA

O SOL NASCE NO LESTE (VOSTOK) E PÕE-SE NO OESTE (EAST)

Frase

"(...) A história se repete: a primeira vez como tragédia. A segunda e outras vezes como farsa da tragédia anunciada. (...)" Karl Heinrich Marx (05/05/1818-14/03/1883)

Fatos

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quinta-feira, 24 de agosto de 2017

Aos que virão depois de nós

 I
Eu vivo em tempos sombrios.
Uma linguagem sem malícia é sinal de estupidez,
uma testa sem rugas é sinal de indiferença.
Aquele que ainda ri é porque ainda não
recebeu a terrível notícia.

Que tempos são esses, quando falar sobre flores é quase um crime.
Pois significa silenciar sobre tanta injustiça?
Aquele que cruza tranquilamente a rua já está então inacessível aos amigos que se encontram necessitados?

É verdade: eu ainda ganho o bastante para viver.
Mas acreditem: é por acaso.
Nada do que eu faço dá-me o direito de comer quando eu tenho fome.
Por acaso estou sendo poupado.
(Se a minha sorte me deixa, estou perdido!)

Dizem-me: come e bebe!
Fica feliz por teres o que tens!
Mas como é que posso comer e beber, se a comida que eu como, eu tiro de quem tem fome? Se o copo de água que eu bebo faz falta a quem tem sede?

Mas apesar disso, eu continuo comendo e bebendo.
Eu queria ser um sábio.
Nos livros antigos está escrito o que é a sabedoria: manter-se afastado dos problemas do mundo e, sem medo, passar o tempo que se tem para viver na terra; seguir seu caminho sem violência, pagar o mal com o bem, não satisfazer os desejos, mas esquecê-los. Sabedoria é isso!

Mas eu não consigo agir assim.

É verdade, eu vivo em tempos sombrios!

II 

Eu vim para a cidade no tempo da desordem, quando a fome reinava.
Eu vim para o convívio dos homens no tempo da revolta e me revoltei ao lado deles.
Assim se passou o tempo que me foi dado viver sobre a terra.
Eu comi o meu pão no meio das batalhas, deitei-me entre os assassinos para dormir,
Fiz amor sem muita atenção e não tive paciência com a natureza.
Assim se passou o tempo que me foi dado viver sobre a terra.

III

Vocês, que vão emergir das ondas em que nós perecemos, pensem, quando falarem das nossas fraquezas, nos tempos sombrios de que vocês tiveram a sorte de escapar.

Nós existíamos através da luta de classes, mudando mais seguidamente de países que de
sapatos, desesperados! Quando só havia injustiça e não havia revolta.

Nós sabemos: o ódio contra a baixeza também endurece os rostos!
A cólera contra a injustiça faz a voz ficar rouca!

Infelizmente, nós, que queríamos preparar o caminho para a amizade, não pudemos ser, nós mesmos, bons amigos.

Mas vocês, quando chegar o tempo em que o homem seja amigo do homem, pensem em nós com um pouco de compreensão.


Antologia Poética de Bertolt Brecht, dramaturgo, poeta e encenador alemão que viveu entre os anos de 1898 e 1956 (Século XX)


Aqueles que comem sua cota discursam aos pobres sobre tempos maravilhosos que virão; aqueles que levam a nação ao abismo dizem ao cidadão comum que governar é difícil. Bertolt Brecht

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