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quarta-feira, 13 de setembro de 2017

Em junho de 2017, trabalhadores do “Hoje em Dia” ocuparam “Predinho” que JBS diz ter comprado para pagar Aécio Neves da Cunha

Jornalistas, gráficos e empregados na administração do jornal “Hoje em Dia” dispensados há mais um ano ocuparam na manhã de quinta-feira (1º/06) a antiga sede da empresa, localizada no Bairro Santa Efigênia, em Belo Horizonte. Os objetivos da ocupação são denunciar as falcatruas envolvidas na venda do prédio, reveladas na delação da JBS, e chamar a atenção para o calote do jornal, que até hoje não pagou aos mais de 100 trabalhadores o acerto de rescisão e nem o salário do último mês trabalhado, além de outros direitos trabalhistas.

A ocupação ocorreu às seis horas da manhã e contou com a fraternidade do Sindicato dos Jornalistas Profissionais de Minas Gerais (SJPMG), Sindicato dos Gráficos, Sindicato dos Empregados na Administração de Jornais e revistas, Sindicato Intermunicipal dos Trabalhadores na Indústria Energética de Minas Gerais (Sindieletro-MG) e Sindicato dos Trabalhadores nas Indústrias de Purificação e Distribuição de Água e em Serviços de Esgotos do Estado de Minas Gerais (Sindágua-MG) e de militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem-Terra (MST), da União Nacional dos Estudantes (UNE) e do Levante Popular da Juventude.

“Esta é uma ocupação pacífica, não é uma ocupação para posse do imóvel”, disse o então presidente do SJPMG, Kerison Lopes, em discurso aos moradores e transeuntes. Ele informou que a intenção foi denunciar à sociedade mineira a situação dos trabalhadores do “Hoje em Dia” e exigir das autoridades a solução para o problema. “Queremos que os trabalhadores que ajudaram a construir este jornal recebam seus direitos”, enfatizou.

A ocupação prosseguiu na sexta-feira (02/06), quando uma assembleia avaliou a continuidade do movimento. À noite, houve debate sobre a influência dos irmãos Aécio e Andrea Neves na imprensa mineira, com participação do jornalista João Paulo Cunha e da presidente da Central Única dos Trabalhadores de Minas Gerais (CUT-MG), Beatriz Cerqueira.

(Crédito da foto: Isis Medeiros/Jornal “Brasil de Fato”)

Não era o que parecia ser

No edifício desocupado há quatro meses, a imprensa pôde constatar algumas curiosidades, além de grande quantidade de lixo, papéis, lotes de jornais, fios, materiais de informática etc, deixada para trás quando o jornal mudou para a atual sede, no bairro Prado. Uma das curiosidades foram as contas de água do prédio emitidas pela Companhia de Saneamento de Minas Gerais (Copasa-MG), que se mantiveram constantes nos últimos meses, embora o local esteja vazio desde fevereiro.

Outra curiosidade foi o painel plotado na entrada que faz propaganda da reforma gráfica e editorial do jornal, quando se tornou tabloide. Ele expôs para a posteridade o projeto ambicioso da empresa que, ainda sob o comando da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), proprietária do jornal durante 22 anos, pretendia conquistar os leitores com vários novos cadernos. Data da reforma: 19 de junho de 2012. Tiragem da “edição histórica”, segundo notícia do próprio jornal: 100 mil exemplares. Pouco mais de um ano depois, o jornal foi vendido.

Em setembro de 2013, a Iurd, proprietária da Rede Record de Televisão e que sempre pareceu estar mais interessada na gráfica do “Hoje em Dia”, na qual imprimia seu semanário “Folha Universal”, cuja tiragem, distribuída gratuitamente, ultrapassava um milhão de exemplares, vendeu o jornal ao Grupo Bel de Comunicação, dono de diversas emissoras de rádio em Minas Gerais, entre elas a 98 FM. O negócio foi estimado em R$ 40 milhões, segunda notícia da revista “Exame”.

“A Rede Record informa ter concluído a operação de venda do controle acionário da Ediminas S/A- Editora Gráfica e Industrial de Minas Gerais, sediada em Belo Horizonte, para o Grupo Bel, também sediado na capital mineira”, informou comunicado do jornal divulgado no dia 10 de setembro de 2013.

Dizia ainda o comunicado. “Os grupos Record e Bel já foram parceiros em outros negócios bem sucedidos envolvendo o segmento da radiodifusão e seguem mantendo, com a negociação ora concluída, o mesmo alto nível de relacionamento institucional e de respeito aos seus colaboradores, fornecedores, clientes e parceiros comerciais”.

Segundo a Record, o Grupo Bel atuava no mercado de comunicação e de entretenimento há 46 anos, tendo sido pioneiro em radiodifusão no país, responsável por colocar no ar a primeira rádio FM estéreo do Brasil e que desenvolvia, ao longo de sua história, projetos inovadores na área de telecomunicações.

Em outro comunicado, publicado no site oficial da empresa, o grupo Bel afirmava, “O jornal ‘Hoje em Dia’ agora faz parte de nossa história de sucesso”. Todas estas eram informações oficiais, públicas, propaganda, “para o mercado”. Não correspondiam à realidade, porém, como revelou a delação do empresário Joesley Batista, proprietário da JBS. Nos bastidores, corrupção, campanha eleitoral e benefícios fraudulentos a empresas privadas, sempre à custa de dinheiro público, eram as verdadeiras causas dos negócios envolvendo o “Hoje em Dia”, que não apareciam nas notícias.

Após a delação soube-se que, cinco meses antes do Grupo Bel comprar o jornal das mãos dos bispos da TV Record, o governo de Minas Gerais, então comandado pelo hoje senador Antonio Augusto Junho Anastasia, desapropriou um imóvel da Rádio Del Rey, que pertence à família proprietária do Grupo Bel.

A desapropriação custou R$ 1 milhão e 90 mil aos cofres públicos e o pagamento foi realizado em junho de 2013. O Sindicato apurou que o valor inicial proposto para o terreno foi R$ 572 mil e que, posteriormente, foi aumentado para R$ 1 milhão e 90 mil. Cabe aos procuradores e à Polícia Federal investigar se a desapropriação foi uma maneira de o governo mineiro ajudar a financiar, com dinheiro público, a compra do jornal. Os fatos são que a desapropriação milionária aconteceu às vésperas do negócio e que no ano seguinte o jornal apoiou sem nenhum pudor as candidaturas dos tucanos Aécio Neves da Cunha à presidência e Pimenta da Veiga para governador.

Embora não fosse o único jornal mineiro a tomar partido a favor de Aécio, o “Hoje em Dia” destacou-se ao publicar uma pesquisa que, na contramão de todas as outras pesquisas de opinião, dava favoritismo ao tucano. Publicada como manchete no portal do jornal no dia 14 de outubro, a notícia foi usada imediatamente na propaganda eleitoral do candidato. O episódio provocou críticas nas redes sociais e a demissão do jornalista Aloísio Morais do “Hoje em Dia”, acusado de compartilhar informações que prejudicavam a empresa. Aloísio, que trabalha no jornal há 28 anos e é diretor do Sindicato, entrou na justiça e ganhou em todas as instâncias. Depois de 22 meses, foi reintegrado, por determinação judicial, em setembro de 2016.

Venda do jornal e do predinho

Após a derrota dos candidatos apoiados pelo jornal, o “Hoje em Dia” entrou numa fase de decadência. Relatos de jornalistas informam que os proprietários do Grupo Bel pareciam desinteressados do veículo e não cuidavam nem da manutenção do prédio. Ao mesmo tempo, os descumprimentos da legislação trabalhista se agravaram e os salários atrasaram.

Foi quando aconteceu a venda do “Hoje em Dia” para seu atual dono, o ex-prefeito de Montes Claros, médico e empresário Ruy Muniz. A informação circulava, mas não era confirmada. Em dezembro de 2015, a Ediminas se desfez da sua gráfica, dispensou seus 78 funcionários e passou a imprimir o “Hoje em Dia” na gráfica do concorrente “O Tempo”. Os acertos não foram pagos e, em janeiro, os gráficos invadiram a empresa, em protesto. A pressão deu resultado: os salários foram pagos, mas a rescisões continuaram sendo cobradas na justiça.

A notícia do negócio foi publicada pelo jornal “O Tempo” no dia 24 de fevereiro. De posse do jornal, mas sem se mostrar, administrando por meio de prepostos, Muniz, que meses depois seria preso pela Polícia Federal acusado de corrupção, anunciou planos e investimentos, mas em vez disso, no dia 27 de fevereiro, o jornal, embora impresso, não circulou, por falta de pagamento à distribuidora. No dia 29 de fevereiro, no fim do expediente, a empresa dispensou 38 jornalistas. Não pagou o salário do mês nem o acerto, que até hoje são cobrados na justiça.

Na ação judicial, os jornalistas tentaram que o edifício sede do jornal se tornasse garantia da dívida trabalhista, mas descobriram que ele tinha sido vendido por R$ 18 milhões à J&F, controladora da JBS, em parcelas de R$ 1 milhão, pelos antigos donos, a família Carneiro. Tentaram embargar o pagamento das parcelas que faltavam, mas a família Carneiro alegou que o pagamento tinha sido antecipado e todo o dinheiro já tinha sido recebido. A delação de Joesley Batista esclareceu o que realmente se passou. Ele revelou à Procuradoria Geral da República que pagou pela compra do edifício sede do “Hoje em Dia” R$ 17.354.824,75, valor que ele mesmo considerou superfaturado. O objetivo não era o “predinho”, mas fazer chegar dinheiro às mãos de Aécio Neves da Cunha, usando como intermediário Flávio Carneiro.

Joesley revelou também que, meses antes dessa operação, a J&F pagou ao jornal R$ 2 milhões e 500 mil, a título de “compra antecipada de publicidade”. É provável que um negócio assim nunca tenha sido feito antes por um jornal: documento assinado por um diretor do Grupo Bel e entregue por Joesley à Procuradoria Geral da República atesta a compra de nada menos do que 365 páginas de publicidade pela JBS.


Segundo Joesley, ele doou ilegalmente um total de R$ 60 milhões ao senador afastado Aécio Neves da Cunha que seriam usados na sua campanha presidencial de 2014. Enquanto os mais de 100 trabalhadores do “Hoje em Dia” eram lesados em seus direitos, os proprietários do jornal usavam a empresa como laranja para fazer circular dinheiro de corrupção.

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